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Nascimento de Cristo




Nascimento de Cristo

Queridos irmãos e irmãs!


Nestes dias, à medida que nos aproximamos da grande festa do Natal, a liturgia estimula a intensificar a nossa preparação, pondo-nos à disposição muitos textos bíblicos do Antigo e do Novo Testamento, que nos estimulam a focalizar bem o sentido e o valor desta celebração anual. Se por um lado o Natal nos faz comemorar o prodígio incrível do nascimento do Filho Unigénito de Deus da Virgem Maria na gruta de Belém, por outro exorta-nos também a aguardar, vigiando e rezando, o nosso próprio Redentor, que no último dia "virá julgar os vivos e os mortos".


Talvez nós hoje, também nós crentes, aguardamos realmente o Juiz; mas todos esperamos a justiça. Vemos tanta injustiça no mundo, no nosso pequeno mundo, em casa, no bairro, mas também no grande mundo dos Estados, das sociedades. E esperamos que seja feita justiça. A justiça é um conceito abstrato: faz-se justiça. Nós esperamos que venha concretamente quem pode fazer justiça.


E neste sentido rezamos: Vinde, Senhor, Jesus Cristo como Juiz, vinde segundo o vosso modo. O Senhor sabe como entrar no mundo e criar justiça. Peçamos ao Senhor, o Juiz, que nos responda, que crie realmente justiça no mundo. Esperemos a justiça, mas isto não pode ser apenas a expressão de uma certa exigência em relação aos outros. Esperar a justiça no sentido cristão indica sobretudo que nós próprios começamos a viver sob o olhar do Juiz, segundo os critérios do Juiz; que começamos a viver na sua presença, realizando a justiça na nossa vida.


Assim, realizando a justiça, pondo-nos na presença do Juiz, esperamos realmente a justiça. E este é o sentido do Advento, da vigília. Vigília do Advento significa viver sob o olhar do Juiz e preparar-nos assim nós mesmos e o mundo para a justiça. Deste modo, portanto, vivendo sob o olhar do Deus-Juiz, podemos abrir o mundo para a vinda do seu Filho, predispor o coração para acolher "o Senhor que vem". O Menino, que há cerca de dois mil anos os pastores adoraram numa gruta na noite de Belém, não se cansa de nos visitar na vida quotidiana, enquanto como peregrinos estamos encaminhados para o Reino.


Na sua expectativa o crente torna-se então intérprete das esperanças da humanidade inteira; a humanidade anseia pela justiça e assim, mesmo se com frequência de modo inconsciente, aguarda Deus, espera a salvação que só Deus nos pode dar. Para nós cristãos esta expectativa está marcada pela oração assídua, como sobressai bem na série sugestiva de invocações que nos são propostas, nestes dias da Novena de Natal, quer na Missa, na aclamação ao Evangelho, quer na celebração das Vésperas, antes do cântico do Magnificat.


Cada uma das invocações, que imploram a vinda da Sabedoria, do Sol de justiça, do Deus connosco, contém uma oração dirigida ao Esperado pelos povos, para que apresse a sua vinda. Invocar o dom do nascimento do Salvador prometido significa contudo comprometer-se a aplanar-lhe o caminho, a preparar-lhe uma habitação digna não só no ambiente à nossa volta, mas sobretudo no nosso coração. Deixando-nos guiar pelo evangelista João, procuremos portanto dirigir nestes dias a mente e o coração para o Verbo eterno, o Logos, para a Palavra que se fez carne e de cuja plenitude recebemos graça sobre graça (cf. 1, 14.16).


Esta fé no Logos Criador, na Palavra que criou o mundo, n'Aquele que veio como Menino, esta fé e a sua grande esperança hoje parecem infelizmente distantes da realidade da vida vivida todos os dias, pública ou individual. Esta verdade parece muito grande. Nós mesmos nos arranjamos segundo as possibilidades que encontramos, pelo menos assim parece. Mas desta forma o mundo torna-se cada vez mais caótico e também violento: vemo-lo todos os dias. E a luz de Deus, a luz da Verdade, apaga-se. A vida torna-se escura e desorientada.


Como é então importante que sejamos realmente crentes e como crentes reafirmemos com vigor, com a nossa vida, o mistério de salvação que a celebração do Natal de Cristo traz consigo! Em Belém manifestou-se ao mundo a Luz que ilumina a nossa vida; foi-nos revelada a Vida que nos leva à plenitude da nossa humanidade. Se não reconhecermos que Deus se fez homem, que sentido tem festejar o Natal? A celebração torna-se vazia. Antes de tudo, nós cristãos devemos reafirmar com profunda e sentida convicção a verdade do Natal de Cristo, para testemunhar diante de todos a consciência de um dom inaudito que é riqueza não só para nós, mas para todos. Disto brota o dever da evangelização que é precisamente a comunicação deste "eu-angelion", desta "boa nova". Isto foi recordado recentemente pelo documento da Congregação para a Doutrina da Fé, denominado Nota doutrinal sobre alguns aspectos da evangelização, que desejo entregar à vossa reflexão e ao vosso aprofundamento pessoal e comunitário.


Queridos amigos, nesta já imediata preparação para o Natal a oração da Igreja faz-se mais intensa, para que se realizem as esperanças de paz, de salvação e de justiça de que o mundo hoje tem urgente necessidade. Peçamos a Deus que a violência seja vencida pela força do amor, as contraposições cedam o lugar à reconciliação, a vontade de subjugar se transforme em desejo de perdão, de justiça e de paz. Os votos de bondade e de amor que desejamos uns aos outros nestes dias alcancem todos os âmbitos do nosso viver quotidiano. A paz esteja nos nossos corações, para que se abram à acção da graça de Deus. A paz habite nas famílias e que elas transcorram o Natal unidas diante do presépio e da árvore enfeitada de luzes. A mensagem de solidariedade e de acolhimento que provém do Natal, contribua para criar uma sensibilidade mais profunda para com as antigas e novas formas de pobreza, para o bem comum, no qual todos somos chamados a participar. Todos os membros da comunidade familiar, sobretudo as crianças, os idosos, as pessoas mais débeis, possam sentir o calor desta festa, que se prolongue depois durante todos os dias do ano.


O Natal seja para todos festa da paz e da alegria: alegria pelo nascimento do Salvador, Príncipe da paz. Como os pastores, apressemos desde já os nossos passos rumo a Belém. No coração da Noite Santa também nós poderemos então contemplar o "Menino envolvido em panos, que jaz numa manjedoura", juntamente com Maria e José (cf. Lc 2, 12.16). Peçamos ao Senhor que abra o nosso coração, para que possamos entrar no mistério do seu Natal. Maria, que doou o seu seio virginal ao Verbo de Deus, que o contemplou Menino nos seus braços maternos, e que continua a oferecê-lo a todos como Redentor do mundo, nos ajude a fazer do próximo Natal uma ocasião de crescimento no conhecimento e no amor a Cristo. São estes os votos que formulo com afecto a todos vós aqui presentes, às vossas famílias e a quantos vos são queridos.

Bom Natal a todos vós!



S.S. PAPA EMÉRITO BENTO XVI

AUDIÊNCIA GERAL

Sala Paulo VI Quarta-feira, 19 de Dezembro de 2007

https://www.vatican.va/content/benedict-xvi/pt/audiences/2007/

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